quinta-feira, 27 de maio de 2010

mulher direita

Faz tempo que eu não envio nada para o meu blog. Tempos conturbados, na verdade. Difícil escrever amenidades, pessoal. Estamos em greve no TRE/SP: salário descontado, faltas injustificadas, ameaças da alta cúpula. Como filosofava a cantora Kátia “não está sendo fácil”.
Dia desses, numa das assembleias (como diria o Eli: eu quero o meu acento de volta!), um dos rapazes tomou a palavra. Disse que achava um absurdo os grevistas tentarem convencer, por meio de "palavras bruscas", aqueles que não participavam. Ele disse também que, mais importante que as nossas reivindicações, eram a amizade e o bom relacionamento com os colegas.
Não pude deixar de me lembrar de quando eu era criança. Minha mãe era professora e, numa das primeiras greves do professorado paulista, meu pai, na sua lógica tirada de algum manual do machista do século, impediu-a de participar do movimento. Disse que greve “não era coisa de mulher direita”. E, a partir daquele momento, ela se transformou numa pelega que passou a comer o pão que o diabo amassou: chegava do trabalho abatida, fazia a comida a duras penas e, muitas vezes, eu a flagrava chorando no banheiro. As colegas dela, “doces” professoras com a “caminho suave” debaixo do braço, viraram leoas: faziam piquete, diziam-lhe impropérios e, mesmo depois que a greve acabou, muitas delas só voltaram a dirigir-lhe a palavra séculos mais tarde. E minha pobre mãezinha, desnecessariamente dividida entre a profissão e a vida conjugal, amargou um dos seus momentos mais difíceis. Somente anos mais tarde, já amadurecida e com mais força na peruca, mandou a opinião do meu pai às favas e participou de outros movimentos, carregando faixas nas passeatas.

Pois é, caros amigos, relato esse causo porque acredito que tomar uma decisão de greve (participando ou não) é dura e mostra que o buraco é mais embaixo. Não dá para achar, como o sujeito citado lá no começo do texto, que os grevistas vão dar as mãos aos não grevistas e cantar, pacificamente, “amigos para sempre”. Se até as professorinhas lindinhas ficavam arretadas e sentavam a pua, por que achar, ingenuamente, que para nós, do judiciário, a coisa vai se dar de forma oposta, na mais plena harmonia, com elfos e ninfas cobrindo nosso caminho com flores do campo? Ou é muita ingenuidade ou é mesmo muita tchonguice, faça-me o favor!

Bem, vou parando por aqui porque amanhã devo me preparar para mais um dia de aperreio. E vou aproveitar e ligar para o meu pai, informando-lhe que eu tb não sou uma mulher direita. Talvez uma mulher de esquerda, pai, sinto muito...