domingo, 24 de outubro de 2010

Mente quieta, espinha ereta e o coração tranquilo...

Depois de tantas “emoções eleitorísticas” aqui no TRE, volto a visitar o meu velho blog , que já devia estar carentão.
Em meio à correria dos últimos tempos, não tive tempo de relatar minha mais nova experiência, desta vez meditabunda, ocorrida em setembro. Foi numa tarde gélida e de muita garoa em São Paulo. Minha amiga Vera e eu decidimos visitar o Instituto Nyingma, no bairro de Pinheiros, em São Paulo, um centro que trouxe para o Brasil os ensinamentos do budismo Tibetano, com práticas de meditação e estudos budistas. Fomos em busca da meditação para iniciantes.
Chegamos no começo da tarde, numa casa belíssima, muito espaçosa, lembrando esses casarões do interior. Um lugar paradisíaco incrustado no meio da cidade. Chegamos com a cara, com a coragem, e com os cambitos congelados. Assim que entramos, fomos falar com a moça da recepção, de quem tivemos que ler os lábios, tão baixinho era o modo como falava. Baixei o meu volume interior e respondi meio que sussurrando também.
Na sala de espera, havia os seguintes dizeres: “Pratique a fala essencial”, que, para bom entendedor se traduz como: “feche a matraca”. Veruska e eu fomos perscrutar a biblioteca na ampla sala: livros sobre o Tibete , sobre o Budismo, sobre psicologia, entre outros assuntos. Só de sentir o perfume bom do incenso e ler a capa dos livros, já fui me sentindo mais elevada (o que não é o poder da sugestão...).
Depois de algum tempo, chegou a guru da meditação. Confesso que fiquei meio decepcionada com a indumentária da cidadã. Não lembrava em nada aquela vestimenta cheia de panos coloridos que a gente vê em filmes. Trajada com uma roupa comum, conduziu o grupo para a parte superior da casa. Tiramos o sapato e adentramos o local. Tomei um choque: um carpete cor de carne, para lá de vívido, e paredes azul-marinho compunham o ambiente. Parecia a casa da luz vermelha, onde moçoilas não muito comportadas se instalam.... (ah, as imagens pré-concebidas dos romances do Jorge Amado...)
Mas o fato é que as cores eram tão fortes que deixavam os seus sentidos mais alerta e obviamente era essa a intenção (diferente dos matizes esmaecidos que eu tinha imaginado para embalar a minha prática.... ou o meu sono).
A nossa mestra, sem muitas delongas e salamaleques, foi logo explicando a postura da meditação: faça assim com as pernas, faça assado com as mãos, fique com as costas retas, respire profundamente....
Demos uma última ajeitada nas costas e, quando eu imaginava que a dona muié fosse contar uma historinha sobre os monges do Tibete, qual o quê! Foi pau na jaca na meditação, direto e reto. Eu nem acreditei. Pensei com os meus botões: “Mas eu sou iniciante, e já começa assim? Não vou conseguir ficar nessa posição a tarde inteira nem a pau, Juvenal”. Comecei a sentir coceira no nariz; o pé já havia esquentado um pouco, mas ainda formigava; as costas começaram a ficar pesadas, parecia que tinham colocado uma bigorna nela. Foi quando tive um ímpeto de simular um desmaio, para poder sair com uma certa dignidade do local. Um monte de pensamento congestionava a minha cabeça: “eu não deveria ter vindo; podia estar em casa agora lendo um livrinho; que tarde mais desgraçada de fria; a minha perna está doendo; ai que vontade de sair correndo. Acho que vou cantar mentalmente uma musiquinha para passar o tempo... tã nã nã nã nã....Ô, meu santinho, onde eu vim amarrar a minha égua?”
Mas... o tempo foi passando, passando....e passando. Sem ter o que fazer, comecei então a reparar em alguns passarinhos do lado de fora (sim, descobri que os passarinhos tb saracuteiam em dias friorentos); puxa, mas que fragrância gostosa tinha também aquele incenso da sala, parecia de rosas, sei lá, o mesmo cheiro do jardim de minha tia-avó; lembranças da infância dançaram por alguns momentos – nem sei quantos - em minha memória; consegui sentir a cadência da respiração dos outros que estavam na sala; o ambiente já estava mais quentinho, mais aconchegante. A aflição foi se esvaindo. Aquietei-me, por fim. Fizemos algumas paradas durante a tarde, só para esticar as canelas, e logo retornávamos para a nossa posição de ioguine.
Saí de lá com uma sensação muito diferente: parecia que tinha acordado de um longo sono e que tinha tido um sonho bom.
Foi uma experiência intensa, a princípio bastante difícil, mas agora eu me sentia surpreendentemente leve. Eu e Veruska nem falamos muito na volta, porque estávamos ainda inebriadas por aquela sensação “paz e amor”, mora? Quem diria que ficar quietinho poderia dar aquele barato todo...
Chegando em casa, me lembrei de um livro que eu tinha lido há pouco tempo: “Devagar”, de Carl Honoré, em que o autor prega o combate ao culto da velocidade, desde o ato de se alimentar, criar filhos, trabalhar. No capítulo Mens Sana in Corpore Sano, ele diz: “ Como uma abelha num jardim, o cérebro humano naturalmente pula de um pensamento para o seguinte. O que predomina, em vez da reflexão, é a reação (...) A meditação é uma forma de treinar a mente a relaxar. Ela diminui a pressão arterial e gera maior quantidade das ondas alfa e teta no cérebro. Essa concentração mental afeta a amígdala, a região do cérebro associada ao medo, à ansiedade e à surpresa, tornando seus praticantes mais tranquilos”.
Isso explicava aquela sensação boa do momento.
Obviamente ainda precisarei de muito chão se quiser as benesses dessa prática. Mas, de qualquer forma, é muito bom saber que, sentando-se e tentando ficar quietinho por algum tempo, é possível entrar numa sintonia de equilíbrio e tranquilidade. Nesses tempos conturbados, quando nem sempre podemos contar com as pessoas, pelo menos podemos buscar paz em algum cantinho recôndito, dentro de nós mesmos.